Conversas
sobre o Mediterrâneo
Quando os Romanos baptizaram o Mar Mediterrâneo
de “Mare
Nostrum” – o Nosso Mar – não tinham sido
os primeiros nem os últimos a sonhar com um império
que abrangesse grande parte da Europa, Norte de África e Ásia
Menor, tendo o Mar Mediterrâneo como o coração.
Muito antes, já os Fenícios e os Gregos tinham instalado
as suas colónias nesta região, com o intuito de controlar
as rotas comerciais mais lucrativas daquilo que era, então,
o mundo conhecido. E mesmo muito depois da queda do Império
Romano, os Mouros e os Otomanos conseguiram (pelo menos em parte)
fazer reviver este sonho, unindo vastas regiões das costas
do Mediterrâneo debaixo de uma única lei durante centenas
de anos. Mais de três mil anos de história comum,
contactos comerciais intensos, ocupações e trocas
fizeram da Região do Mediterrâneo um mosaico de culturas
fascinante e extremamente rico, onde se misturam e opõem
características das muitas civilizações que
floresceram nas costas do Mar Mediterrâneo.
Após a
queda do Império Otomano, as aspirações
coloniais dos Ingleses e Franceses romperam com o ‘sonho
Mediterrâneo’, inserindo a região numa nova
lógica Norte-Sul. A bipolarização da política
mundial que se seguiu (incluindo a criação da União
Europeia) acabou de vez com qualquer perspectiva ‘regionalista’ sobre
a Bacia do Mediterrâneo. Os acontecimentos recentes apontam
mesmo para uma visão oposta a esta. No contexto do chamado “Choque
de Civilizações” e que parece inspirar a maioria
das tendências políticas da actualidade, o Mediterrâneo
não é visto como uma região, mas antes como
uma fronteira extremamente volátil onde se confrontam, de
forma violenta, quatro grandes civilizações.
É,
portanto, bastante curioso que, no início dos
anos 90, tenha surgido no discurso oficial da UE o novo termo “Área
Euro-Mediterrânea”, dando-o uma importância crescente
no contexto das chamadas políticas de vizinhança,
desenhadas para criar “uma zona de prosperidade e de vizinhança
amigável – um ‘círculo de amigos’ – com
quem a União Europeia mantém relações
de cooperação estreitas e pacíficas”.
O discurso oficial é quase idílico, mas o que está realmente
na base deste súbito interesse Europeu pela região
do Mediterrâneo? Basicamente, dois desenvolvimentos extremamente
importantes.
Ainda não tinha assentado o pó da queda
do muro de Berlim e já vários conflitos rebentavam
(ou ressurgiam) por toda a região do Mediterrâneo:
a guerra na Jugoslávia,
o conflito Greco-Turco a propósito do Chipre, a ocupação
Israelita da Palestina e a intifada, uma guerra civil
latente na Argélia, a revolta de Polisario no sudeste
Marroquino, a explosão sem precedentes do terrorismo,… Liberto
da polarização da Guerra Fria, o mito romântico
do Mediterrâneo, ‘berço das civilizações’,
cedeu para a amarga realidade de conflito e violência.
O
segundo grande desenvolvimento está relacionado com
as importantes mudanças demográficas que estão
a decorrer no seio da União Europeia, quer pela imigração,
quer pelo crescimento relativo das populações minoritárias
existentes. Neste contexto, as políticas de vizinhança
com a Turquia e o Norte de África tornam-se relevantes não
só para a política externa da União Europeia
mas também para as políticas internas de muitos dos
seus estados membros.
Seja qual o motivo, a Bacia do Mediterrâneo é um
novo tópico de discussão pleno de implicações
políticas, económicas e culturais. No contexto do
festival al kantara , Danças na Cidade organiza duas noites
de conversa, dedicadas a algumas das questões com as quais
a região se debate.
Entre o mito e a realidade
– as civilizações e o estatuto
cultural
2 DE NOVEMBRO,
TERÇA-FEIRA, 19H00
CASA D’OS DIAS DA ÁGUA
O primeiro debate, “Entre
o Mito e a Realidade”,
centra-se no estatuto cultural/civilizacional do Mediterrâneo. É esta
uma região com uma verdadeira coesão cultural ou
antes uma zona fronteiriça disputada por civilizações
rivais? Existe realmente uma base comum para se falar numa proximidade
cultural entre os países do Mediterrâneo? Ou deveríamos
antes assumir que o Mediterrâneo é caracterizado pela
diversidade cultural e incorporar o carácter intercultural
de qualquer diálogo que se estabeleça? Quais as políticas
culturais existentes na região? Quais os programas que a
Comissão Europeia está em vias de lançar?
São adequadas, estão adaptadas à realidade
no terreno? Como pretendem interagir a nível governamental
e individual e reforçar a sociedade civil? Qual o papel
das artes e a visão dos artistas e os agentes culturais
sobre intercâmbio cultural dentro da Bacia Mediterrânea?
Tarek
El Fetouh [Egipto] director
Young Arab Theatre Fund
Bojana Cvejic [Sérvia] performer
e teórica de artes performativas
Pascal Brunet [França] director
Relais Culture Europe, Paris
António Pinto Ribeiro [Portugal] consultor
artístico e programador
Entre hoje e amanhã
– o estatuto político e o diálogo
cultural
9 DE NOVEMBRO,
TERÇA-FEIRA, 19H00
CASA D’OS DIAS DA ÁGUA
No segundo debate, intitulado “Entre
Hoje e Amanhã” serão
levantadas questões sobre o estatuto geo-político
do Mediterrâneo e a relevância do pensamento intercultural
e da acção cultural (no sentido lato) na gestão
política da região. Quais as forças geo-políticas
que determinam a realidade de hoje? O que significam a política
de vizinhança Euro-Med e o Processo de Barcelona na realidade? É possível
estabelecer um diálogo cultural no actual clima político?
Se não, o que deve ser feito para o tornar possível?
Qual o papel do intercâmbio artístico?
Omar
Barghouti [Palestina] analista
político e director da companhia de dança El Funoun
Dieter
Lesage [Bélgica] filósofo
e professor no Departamento de Artes Performativas e Audiovisuais
RITS, Universidade Erasmus, Bruxelas
Álvaro Vasconcelos [Portugal] membro
do Instituto de Estudos Estratégicos e Internacionais,
Lisboa
Paul Clairet [França] membro
do Grupo de Conselheiros Políticos do Presidente da Comissão
Europeia – Assuntos Exteriores
Conceito e moderador: Mark
Deputter, director Danças na
Cidade
Intervenções
em inglês e francês. Debate em inglês. |